A Morte como grito de alerta contra a execução sumária em Cadernos Negros, volume 34

 Armandinho, RG desconhecido de Jairo Pinto.

Eu já li em algumas teses que estudam os temas recorrentes em Cadernos Negros, que a tematização da violência é a mais freqüentes entre os escritores que publicam nesta coletânea, mas ao ler o conto de Jairo Pinto no qual é retratado a morte da personagem Armandinho, por prováveis milicianos encapuzados que invadem sua pequena casa quando ele se prepara para ir trabalhar:

“Minutos depois, ao tampar a marmita, Armandinho ouviu umas pegadas cada vez mais violentas, e próximas e uma violenta pesada na porta do barraco. Esta, ao vir abaixo, o deixou na mira de canos de uso exclusivo distribuídos em algumas mãos.”

Ao ler este trecho é possível que um nó se faça na garganta dos mais sensíveis e que várias indagações e indignações vão tomando forma. Uma das possíveis perguntas que possa pairar na mente do leitor é: E os direitos humanos? Seguida de outra: Existe pena de morte no Brasil? Que logo puxa mais perguntas: É uma guerra? É um extermínio? Ninguém vê? Não fazem nada? E mais perguntas podem surgir como se fosse um rosário a ser desfiado como num velório quando se encomenda a alma do falecido.

Neste conto Armandinho morre para denunciar os defuntos anônimos que pontuam as estáticas do senso do IBGE de 2010, que afirma que o índice de morte por causa não naturais é maior entre os homens jovens negros brasileiros até os 25 anos de idade. Armandinho morre no conto de Jairo Pinto, como os vários como ele que são eleitos como suspeitos, são julgados e executados. No conto o autor constrói ficcionalmente a morte de Armandinho, um jovem negro, para que esta morte se eleve como gritos indignados: Ninguém tá vendo? Nós estamos sendo mortos? :


“Foi dada a sentença: algemas descartáveis nos punhos voltados para trás! [...]
Armandinho, machucado, humilhado, aflito... viajava no porta-malas daquele Fiesta prata, placa fria, acompanhado de um cadáver e mil fantasmas que rondavam sua cabeça. [...]
Armandinho foi descido do carro argumentando em sua defesa. Três dos homens encapuzados, que desceram do carro ainda tentaram arrancar nomes de Armandinho, inutilmente... [...]
Neste momento, os estampidos passaram a ressonar quebrando aquele então silêncio matinal, enquanto o corpo negro de Armandinho, rubro em sangue, ia caindo eternamente no chão.”